sexta-feira, 28 de julho de 2017

Vinte e quatro anos na esquerda

Carlos I. S. Azambuja

“O texto abaixo foi escrito por Jarbas Passarinho (foi ministro de Estado, governador e senador) e publicado no Correio Braziliense em 12 de setembro de 2006”

Alain, grande entre os grandes pensadores franceses, dizia, ainda nos alvores do século 20, que se alguém lhe afirmasse que esquerda e direita eram nomes anacrônicos que não mais se diferenciavam ideologicamente, ele tinha certeza de que esse alguém era de direita.

Em 1982, as esquerdas venceram as eleições em nove dos 10 mais importantes estados da Federação. Ficaram com cerca de 80% do PIB nacional. Em 1985, março, as esquerdas dominavam o PMDB e eram o Richelieu do presidente Sarney. A economia, que receberam, era a 8ª do mundo. A anistia fora votada, mas foi unilateral porque as esquerdas eram revanchistas. Devastadores foram os dois choques do petróleo. A inflação, que no governo Médici foi de 14%, chegou a 220% ao ano. Mas na chamada República Nova passou de 12 mil por cento ao ano.

O Plano Cruzado fracassou e o governo escondeu o fracasso até as eleições (estelionato eleitoral), nas quais as esquerdas elegeram quase todos os governadores. Editado o 2º Plano Cruzado, Collor venceu Lula, anunciando que “a direita ficaria indignada e a esquerda perplexa”, sugerindo fazer governo de esquerda. Durou pouco. Itamar assumiu. Vinha de simpatizante da esquerda. Condecorou o MST e o chefe do PC do B com a Grande Medalha da Inconfidência. A esquerda, com ampla maioria na Constituinte, escreveu uma Constituição xenófoba e estatizante, que já tem 50 emendas, inclusive do governo atual.

Fernando Henrique, que fizera agitação nas portas das fábricas ao lado de “Lula, o metalúrgico”, no período do ciclo militar, de líder do PMDB no Senado passou a líder do PSDB, partido semelhante ao russo de 1898, social democrata, de Lênin, antes de bolchevique. Lula fundava o PT, a facção mais radical da esquerda, confirmando a tradição da inevitável divisão das esquerdas. Nas eleições de 1994, Fernando Henrique venceu o antigo companheiro, que reclamava para o PT a bandeira da ética política, e poucos anos antes participara do Fórum de São Paulo, iniciativa do Partido Comunista Cubano, com preeminentes líderes da esquerda armada mundial disposta “a fazer dar certo o que fracassara no comunismo do Leste Europeu”.

Fernando Henrique, na Presidência da República, aprovou a reelegibilidade, acusado pelo PT de haver comprado votos de deputados. Sempre se definindo como homem de esquerda, venceu de novo Lula. No 2º mandato enfrentou as crises econômicas do México e da Rússia, as reservas do BC viraram pó, fez privatizações, o crescimento do PIB foi mínimo, sua política cambial um desastre e seu prestígio, em declínio com o “apagão” e a desvalorização do real.

O PT pedia, nas ruas, em passeatas, o impeachment, bradando “Fora FHC”. Afastou a farda dos ministérios e do Gabinete Militar, que mudou de nome. Ao revés, premiou os esquerdistas, da luta armada ou não, com indenizações por vezes milionárias e salários mensais altos e livres do Imposto de Renda. Não os conquistou. Votaram contra seu candidato à sua sucessão, gerando um slogan: “Assim como Kerenski deu — sem querer — o poder a Lênin, FHC o deu a Lula”, beneficiado da impopularidade do governo. Agora, algo tardiamente, escreve carta aberta a Lula, a quem acusa de “faltar condição moral para governar”.

Reconhece a verdade. Em quatro anos de governo do fundador do PT, qual o saldo da esquerda? Moralidade, zero, com o mensalão mostrando que a ética do governo petista merece, na linguagem de uma cantora, que veio do PT, ser comparado a “São Jorge na parede da casa de tolerância”. Que é feito do Fome Zero que o projetou no mundo como o salvador dos pobres? Nos transportes não construiu uma só estrada. Nas vésperas das eleições mandou tapar-lhes os buracos que as faziam imprestáveis. Em cada buraco um comício comemorativo. À concessão da Bolsa Escola, auxílio à alimentação e vale gás, da política assistencialista tucana, chamou de “esmolas quando deveria dar empregos ao povo”.

Era a esquerda que se dizia diferente e pura a atacar, inclemente, a outra esquerda apelidada de neoliberal. Sagaz, aproveitou as “esmolas”, deu-lhes o nome de Bolsa Família e aumentou o valor mensal. Os empregos, em que via a solução correta, na campanha prometeu criar 10 milhões deles. Não satisfez nem aos quatro milhões de jovens que chegaram aos 18 anos e procuraram empregos entre 2003 e 2006.

Elevou os juros às taxas mais altas do mundo. Estagnou, em conseqüência, o crescimento do país e aumentou a dívida pública a mais de R$ 1 trilhão. O ex-presidente do Bank Boston, neste ano eleitoral, baixou os juros e garantiu os superávits primários para alegria do FMI, de que Lula se livrou para calar os que demonizavam o Fundo. Ideologicamente é desprezado devido a sua metamorfose. Fundadores do PT, decepcionados, dizem-no “o Adhemar de Barros do momento”.

Ou seja: rouba mas faz. Faz o quê? A CNI, que não lhe é adversa, publicou a Visão da Indústria, em que registra: “Nos últimos 10 anos, o Brasil cresceu sistematicamente abaixo da média mundial. Mantida a média de crescimento da renda per capita de 0,7% ao ano, da última década, o Brasil levará 100 anos para dobrar sua renda, ou seja, um século para atingir a atual renda per capita de Portugal”.

Assim a esquerda governa o Brasil, desde o mandarinato do PMDB, faz 24 anos, metade dos quais na Presidência da República. E assim parece querer nosso povo, por mais quatro anos.

Lembrete novamente: o artigo foi escrito em 2006...

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