domingo, 17 de janeiro de 2016

Jesus Ensinou Sobre Reencarnação

Carlos Cardoso Aveline  

A Sabedoria Teosófica Está Presente na Tradição Cristã

Cada estrela no céu pode ser vista como um
símbolo da fagulha divina na consciência humana.

A filosofia esotérica constitui uma chave para desfazer a Torre de Babel que parece separar as diferentes tradições culturais.

Um exemplo disso é que, vista em profundidade, a sabedoria cristã tem inúmeros pontos em comum com as outras religiões.

Existem no Novo Testamento passagens pitagóricas, budistas e confucionistas. Nos Evangelhos, Jesus ensina sobre a lei do carma e sobre a reencarnação. A idéia da “ressurreição na carne” corresponde à metempsicose, ou reencarnação, mas foi deturpada pelo cristianismo tardio. 

Não é difícil perceber que o conceito de ressurreição só faz sentido como umrenascimento da mesma alma em um novo corpo. O tempo e a  natureza não voltam atrás.  Quando uma alma abandona o seu velho corpo físico, provocando aquilo que chamamos de “morte”, a natureza se encarrega da dissolução da casca material inutilizada, e o mesmo organismo não poderá voltar a existir como era. Por outro lado, a alma espiritual é imortal, e ainda não completou seu aprendizado. Ela terá que retornar.

A doutrina da “ressurreição na carne” significa, portanto,  que a alma vive um novo ciclo, e nasce outra vez com um organismo físico renovado e de acordo com as leis da natureza, em  circunstâncias diferentes, para prosseguir seu auto-aperfeiçoamento.

Esta doutrina esotérica foi eliminada das escrituras por razões políticas quando o cristianismo original foi substituído pelo cristianismo imperial. Mas a verdade sempre permanece oculta sob os dogmas politicamente organizados. Apesar da censura editorial dos teólogos medievais, vários indícios da doutrina da reencarnação ainda podem ser encontrados na Bíblia. No Evangelho segundo João, capítulo nove, versículo dois, vemos os discípulos perguntarem a Jesus, referindo-se a um cego de nascença:

“Mestre, quem pecou, ele ou seus pais, para que nascesse cego?”

As condições cármicas de um nascimento refletem de algum modo a realidade de vidas anteriores. 

A antiga crença cristã na reencarnação não surgiu no vazio, mas expressa todo um contexto cultural. O cristianimo tem origem hebraica, e o historiador judaico antigo Flávio Josefo afirma em sua obra “Jewish War” (2; 165) que os fariseus acreditavam na passagem das almas para outros corpos.[1]

No livro de Jó (Yov), capítulo oito, versículo nove, podemos ver uma alusão às nossas vidas passadas. Elas são algo de que não conseguimos lembrar em detalhes, mas  podemos perceber de algum modo:

“... Porque  nós somos de ontem, e nada sabemos; porquanto nossos dias sobre a Terra são como a sombra...”

No Novo Testamento, o apóstolo cristão Paulo ensina a ressurreição, ou reencarnação, no capítulo 15 da sua epístola I Coríntians.

Nos versículos 12-14, ele pergunta:

“Ora, se se prega que Cristo ressuscitou dentre os mortos, como então alguns dizem que não há ressurreição de mortos? E, se não há ressurreição de mortos, também Cristo não ressuscitou. E se Cristo não ressuscitou, então deve ser vã a nossa pregação, e também deve ser vã a vossa fé.”

Nos versículos 35 a 41 do mesmo capítulo 15, Paulo dá mais nitidez à ideia, e mostra a relação direta do fato da reencarnação com a lei do Carma:

“Mas alguém dirá: ‘Como ressuscitarão os mortos? Em que corpo virão?’ Insensato! O que tu semeias não é vivificado, se primeiro não morrer. E, quando semeias, não semeias o corpo que há de nascer, mas o simples grão, como de trigo, ou de outra semente qualquer. Mas Deus dá-lhe o corpo como quer, e a cada semente o seu próprio corpo. Nem toda carne é uma mesma carne, mas uma é a carne dos homens, e outra a carne dos animais [mamíferos], e outra a dos peixes, e outra a das aves. E há corpos celestes e corpos terrestres, mas uma é a glória dos celestes e outra a dos terrestres. Uma é a glória do sol, e outra a glória da lua, e outra a glória das estrelas; porque uma estrela difere em glória de outra estrela.”

De fato, a filosofia esotérica ensina que há três grandes divisões na consciência humana. O corpo físico se relaciona com a Terra; a alma mortal se relaciona com a Lua; a alma imortal ou eu superior corresponde ao Sol e às outras estrelas. A ideia da “estrela” também simboliza “Atma”, a fagulha divina na aura de cada indivíduo.

Entre os primeiros pensadores cristãos, Orígenes, um neoplatônico,  ensinava sobre reencarnação.

Em seu artigo intitulado “Sobre a Pseudo-Teosofia” (“On Pseudo-Theosophy”), Helena Blavatsky escreveu:

“... Não há nada, na crença em reencarnação, que entre em choque com os ensinamentos de Cristo. Ao contrário, nós afirmamos que o grande Adepto de Nazaré claramente ensinou sobre reencarnação. O mesmo fizeram Paulo e os evangelhos sinóticos. Quase todos os primeiros Pais da Igreja, com raras exceções, a aceitavam, e alguns de fato a ensinavam”.

A criadora da filosofia esotérica moderna acrescentou:

“Jesus, o Adepto em que nós acreditamos, ensinava as nossas doutrinas orientais, principalmente CARMA e REENCARNAÇÃO. Quando os chamados cristãos tiverem aprendido a ler o Novo Testamento nas entrelinhas, os seus olhos estarão abertos e - eles verão.”

Poucas linhas mais adiante, no mesmo artigo de 1889, H.P.B. afirma que está feliz porque vê “um belo vento assoprar sobre o cristianismo” e impulsar o pensamento ocidental “cada vez mais para o Oriente”. [2] 

H.P. Blavastky decodificou a mensagem dos Evangelhos. Ela mostrou que eles encerram profundos ensinamentos esotéricos, e também que constituem uma narrativa simbólica da caminhada de um discípulo avançado pelo caminho das grandes iniciações. 

Os Evangelhos não são uma narrativa literal da vida de Jesus, mas uma lenda que transmite lições de sabedoria. Não há registros históricos sobre o Jesus dos Evangelhos. O Jesus real teve uma vida muito diferente do indicado nos Evangelhos e viveu um século antes da Era Cristã. Seu nome é Jeshu (ouJehoshua) ben-Panthera. Nasceu no ano de 120 antes da era cristã, e foi morto no ano 70 da era cristã, segundo a “Guemará” do Talmude babilônico, em seu tratado sobre o Sabath, 67-104. Considerado um grande adepto por H.P.B., Jeshu ben-Panthera foi iniciado nos mistérios egípcios em Alexandria. [3]

Qual a relação, na realidade, entre o Jesus do Novo Testamento, ou mesmo Jeshu ben-Panthera, e a Igreja de Roma, ou as atuais igrejas protestantes? Não há relação alguma. Nem o Jesus do Novo Testamento, nem o Jesus histórico, Jeshu, fundaram qualquer “igreja”, ou adotaram algum ritual.

Toda a montagem teológico-imperial em torno do nome de Jesus ocorreu em uma época muito posterior, como parte de um esquema de poder associado aos restos do império romano decadente. É neste processo que os ensinamentos sobre reencarnação foram arrancados do Novo Testamento, de modo que hoje sobram deles apenas poucos indícios. Os ensinamentos sobre carma que continuam presentes naquele livro também passaram a ser subestimados. O principal objetivo tem sido estimular a obediência aos sacerdotes e aos rituais.

O cristianismo do futuro, porém, saberá resgatar as suas boas origens e perceber a sua irmandade essencial com o que há de melhor nas outras religiões.

A religião do futuro é uma filosofia universal que transcende a letra morta desta ou daquela seita. Ela já está presente no mundo de hoje e pode ser percebida pelo cidadão atento. A sua compreensão se dá passo a passo. Ela faz com que a luz da Alma superior tenha um despertar independente, solidário e incondicional, na vida de cada indivíduo que é honesto consigo mesmo.


NOTAS:

[1] Mencionado em “A Concise Encyclopedia of Christianity”, Geoffrey Parinder, OneWorld-Oxford, copyright 1998, 275 pp., ver p. 204.

[2] “On Pseudo-Theosophy”, texto publicado em “Theosophical Articles”, H.P. Blavatsky, Theosophy Company, Los Angeles, 1981, vol I, 511 pp. A primeira citação está na página 172. A segunda, na página 175.


[3] “A Word With ‘Zero’ ”, em “Collected Writings of H.P.Blavatsky”, The Theosophical Publishing House, Adyar,  Chennai, India, volume IV, pp. 361-362.

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